ECOMUSEU E ENSINO DE HISTÓRIA: DIÁLOGOS SOBRE A IMPORTÂNCIA DE GRUPOS CULTURAIS E DE GÊNERO
Entrelaçar reflexões sobre ensino de história
a práticas educativas referente a educação ambiental reside o objetivo deste
artigo, aspirando, sobretudo analisar e propor a utilização do ecomuseu como
prática docente dos professores da rede básica de educação na cidade de Campo
Grande, capital do Estado de Mato Grosso do Sul.
A emergência de direcionarmos nossos olhares
as questões socioambientais se fazem jus a todo instante. Hoje está em pauta
aquecimento global, desmatamento, desastres naturais e os causados por nós
humanos que possuíamos grande parcela de culpabilidade acerca das questões
ambientais que devastam o planeta a qual pertencemos. Eurípedes Funes [2013]
destacou a humanidade como parte do planeta terra, no entanto, como a pior
parte. Além disto, continuou a direcionar questionamentos importantes para
debatermos, sobretudo, a respeito de quanto tempo o planeta suportará nossas
práticas devastadoras e irresponsáveis que realizamos cotidianamente.
Eurípedes Funes destaca:
‘Grandes perguntas nos fazemos: A que ponto
chegamos? Por que e como chegamos? Que
realidade é esta? O quê nos espera? As explicações técnicas estão dadas, ou
pelo menos são elaboradas. Mas as respostas para a compreensão destas
realidades só são possíveis se presarmos historicamente a relação entre homem e
o meio ambiente, se nos debruçarmos sobre história ambiental buscando
compreender as imbricações entre a natureza a cultura’ [Funes,2013, p.204]
Portanto, é necessário enfatizar que não
trabalharemos história ambiental a partir da perspectiva dos desastres
ambientais, pois seria necessário estudos e análises sobre períodos de média e
longa duração, a qual não se alinha com os objetivos deste artigo.
José Augusto Pádua [2010], nos aponta que
movimentos internos e mudanças importantes consolidadas especialmente no século
XX referente a compreensão do mundo natural, geraram novos desafios
epistemológicos aos historiadores ambientais. O autor destaca que a difusão das
preocupações ambientais proporcionou novos desafios dentro da própria academia
na última década, de modo, que veio a proporcionar novas pesquisas em diversas
áreas envolvendo questões ambientais.
Compreendemos que a prática docente
entrelaçada a prática eco-museologica amplia o leque de possibilidades de
ensino, sobretudo, em relação aos professores de história, que constantemente
se encontram delimitados as condições estruturais das escolas, ao livro
didático e a própria limitação de fundamentação teórica-didática que compõem
sua prática no âmbito formal de ensino.
A Comissão Internacional de Museus [ICOM],
define museu como: ‘Os museus preservam a propriedade cultural mundial e
interpretam-na ao público. Esta não é propriedade comum. Tem um estatuto
especial na legislação internacional e normalmente, existe legislação nacional
para a proteger. Faz parte do património natural e cultural mundial e pode ser
de carácter tangível ou intangível. Muitas vezes, o bem cultural providencia
também a referência primária em vários temas da área, tais como arqueologia e
ciências naturais, e por isso representa uma contribuição importante para o
conhecimento. É também, um componente significativo na definição da identidade
cultural, a nível nacional e internacional´ [Lewis, 2004, p.01]
E nesse sentido, objetivamos demonstrar que
as visitas aos museus colaboram para o aprofundamento do conceito de cultura,
preservação, natureza, meio-ambiente, identidade e memória. Além disto, a
visita proporciona o distanciamento das práticas didáticas tradicionais, práticas
estas corroboram o discurso dos alunos, em relação a uma disciplina monótona,
cansativa e necessária de ser decorada.
Isto posto, é notório a essencialidade de
inserir as práticas educativas museológicas na fundamentação teórico-didática
dos professores de história que atuam especialmente com o ensino fundamental. A
emergente necessidade de refletir sobre novas possibilidades de ensino e
aproximar o individuo do conceito e relação entre meio ambiente e homem ou
vice-versa, se justifica, pois, como dito anteriormente, não podemos tratar
como uma opção aprendermos sobre preservação, devemos tratar como prioridade
essencial.
Apesar de estar inserida nos Parâmetros
Curriculares Nacionais [PCN] desde 1997, a educação ambiental ainda se encontra
distante de ser consolidada no Brasil. De acordo com Loureiro; Cossio [2007], a
motivação inicial está relacionada a iniciativa docente de um ou mais
professores, posteriormente aparece o estímulo apresentado pelos parâmetros
curriculares nacionais. Seguindo nesta perspectiva, a educação ambiental no
Mato Grosso do Sul começa a ganhar força em meados de 1980, sustentado por
campanhas educativas que almejavam a inserção da disciplina Preservação Da
Natureza no currículo das escolas nas redes estaduais do ensino médio, em Campo
grande [Alves,2013]
Nesta ótica, compreendemos, sobretudo, a
necessidade de desenvolver a possibilidade da utilização do ecomuseu como
prática docente na rede de ensino. Atualmente o município de Campo Grande,
possui quatro centros de educação ambiental [CEA] distribuídos pelos bairros da
capital. No entanto, inferimos a necessidade de haver um espaço identitário
para professores, alunos e comunidade. Assim, propomos a utilização do Museu
José Antônio Pereiro, como um espaço ecomuseológico para o desenvolvimento de
uma educação ambiental que construa e aproxime os alunos da relação entre homem
e natureza, preservação, memória, identidade e valorização dos patrimônios
históricos.
De acordo com Brulon [2015], Jean Blanc em
1972 definiu ecomuseu como um museu específico do meio ambiente que funcionava
como um elemento do conhecimento. Por conseguinte, o autor destaca a
´´definição evolutiva´´ proposta por Jean Blanc em 1973. A definição abordava o
ecomuseu como um museu ecológico, em meados de 1978 já se definia o ecomuseu
como uma estrutura nova experimentada e concretizada nos parques naturais. Por
fim, a última versão, define o ecomuseu como laboratório, conservatório e
escola que prioriza as diversidades.
Conforme Scheiner [2012], o termo ‘ecomuseu’
começou a ser caracterizado como sinônimo de museu comunitário, baseado na
fundamentação musealização territorial. A proposta do ecomuseu não é certamente
revolucionária. Para mais, a autora destaca que o ecomuseu é uma reatualização
do fenômeno museu e não uma ruptura com o museu tradicional. A autora apresenta
o ecomuseu como uma alternativa para comunidades que desejam ressignificar suas
relações com espaço, tempo e patrimônio. A autora enfatiza a necessidade de
distanciar a ideia de dicotomia entre o museu tradicional e o ecomuseu, pois em
ambas essencialidades, eles são representações do fenômeno museu. É necessário
refletirmos sobre a proposta do ecomuseu onde a prática comunitária se perde,
especialmente no âmbito político-partidário ou centralizada pelo Estado.
Scheiner [2012], contribui amplamente para essas questões e destaca a
necessidade de se construir uma proposta que cresce da base, ao invés de ser
imposto do alto.
Tratando-se da prática museológica, a autora
aponta que o destaque de inovação do ecomuseu traduz-se no modo de atuar as
funções básicas da museologia. A autora direciona críticas aos museus
comunitários, sobretudo, acerca da institucionalização que ocorreu em grande
parcela dos ecomuseus no decorrer dos anos. De acordo com a autora, esta
institucionalização aproxima cada vez mais o museu comunitário ou o ecomuseu,
do modelo de museu tradicional, distanciando, dessa forma, a principal proposta
de um ecomuseu construído, concentrado e inserido dentro da comunidade e não em
posse de grupos ou indivíduos. Isto posto, pretendemos nos atentar as todas
questões levantadas e propor medidas viáveis para utilização do ecomuseu de
forma eficiente, de modo, que a comunidade consiga usufruir, preservar e criar
ambientes de pluralidade.
Concepções
acerca do ecomuseu e grupos culturais e de gênero: possibilidades de trabalhar
com a memória e conceitos de sustentabilidade na história
Para abordar a questão de gênero, é
importante inserir a definição de Joan Scott, ‘gênero é uma forma primaria de dar
significado às relações de poder’ [SCOTT, 1995, p. 85]. A proposta em analisar a questão de gênero e
sustentabilidade pelos ecomuseus, pois
impulsiona a discussão sobre o saber/fazer feminino, com fundamental inserção
de mulheres em âmbito museológico. Tanto
que, no final do século XIX, o poeta francês Charles Baudelaire escreveu que os
museus eram os únicos locais convenientes para uma mulher [PERROT, 2012, p.
101].
Longe de essencializar o lugar das mulheres,
percebe-se que a metodologia ecomuseológica agrega as ações femininas com mais
enfoque na mobilização, na manutenção de comunidades em prol de um bem comum.
Em 1984 surgiu a Declaração de Oaxtepec [México] visou solidarizar-se com a
Declaração de Santiago do Chile [1972], a Declaração do Québec [1984] e com os
princípios da Ecomuseologia. Definindo na sua declaração que, o território, os
patrimônios e a comunidade constituem uma unidade indissolúvel e que não é
possível preservar uma sem os outros. Nesse sentido, aglutina-se o ecomuseu às
comunidades em que estão inseridos e a preservação de meio ambiente.
Essa perspectiva é levada em conta na nossa
pesquisa, em que pontuamos de que forma os grupos culturais estão envolvidos
nos ecomuseus? Que defesa da sustentabilidade e meio ambiente estão envolvidas
nas ações? Por que os governos estaduais e locais demoram a inserir a
ecomuseologia como elemento de preservação?
Essas e outras questões nos impõem a dinâmica
do ensino de história em diferentes níveis de escolarização. Amparando-se na
“Convenção do Património Mundial, Cultural e Natural” [UNESCO, 1972] que
definiu o patrimônio natural e as paisagens, dialogando sobre a possibilidade
de integrar diferentes áreas e comunidades em torno da preservação.
Dessa forma, pode-se compreender o ecomuseu como
um patrimônio ambiental que, segue uma dinâmica cercada de intervenções
econômicas, sociais e culturais. E ao problematizar o processo de mudanças no
patrimônio cultural, também inserimos a preocupação com a paisagem cultural. Isso porque, a paisagem é patrimônio, a
partir do momento em que é singular, em que as suas dimensões são singulares. O
pode decorrer de duas referências: do apelo ao "solo", ou seja, à
valorização do que se vê – é a paisagem no sentido mais estrito ou usual- e do
apelo ao "passado", ou seja, à historia única que fez lugar
[Lazzarotti, 2003].
Nesse processo de ampliação do entendimento
dos ecomuseus, a questão de gênero impõe novas possibilidades de análise, que
tem no ensino de história e na educação patrimonial as ações de inserção e
problematização. A discussão sobre
Educação Patrimonial e ensino de história contribui para as possibilidades de
diferentes leituras e intepretações de fontes históricas, dos espaços
culturais, das paisagens, da memória, da produção de narrativas e da
constituição da identidade. A Educação Patrimonial pode ser compreendida dentro
de uma perspectiva de Paulo Freire, como um instrumento de “alfabetização
cultural”, pois possibilita ao indivíduo fazer a leitura do mundo que o rodeia,
levando-o à compreensão do universo sociocultural e da trajetória
histórico-temporal em que está inserido.
Concebendo as inúmeras composições culturais
em um Brasil múltiplo, diverso, complexo, e que podem favorecer o entendimento
sobre pertencimento, estranhamento, valorização, manutenção, salvaguarda,
reforço da autoestima dos indivíduos e das comunidades, tendo assim com as
mulheres outras possibilidades de preservação e manutenção das comunidades em
que vivem. A micro-história desenvolveu-se com os estudos de cultura,
especificamente na interação entre o popular e o erudito nas ações cotidianas,
relacionando as diferentes manifestações da cultura, desenvolvidas na Itália
por Carlo GINZBURG [1989]. As proposições apoiaram-se nos conceitos da
“circularidade cultural”, da “intertextualidade”, em que se fundamenta os
‘olhares’ sobre os campos de ação dos sujeitos, do popular ao erudito.
Neste sentido, pontuamos aprofundar as
análises da micro história, no campo metodológico para abordar as concepções da
história regional. Isso porque, os instrumentos de análise e procedimentos de
investigação histórica permitem fazer essa relação, uma vez que pontuamos
análise de patrimônios imateriais na história regional, que são representações
de grupos culturais populares. A história regional faz a análise do cotidiano
de uma comunidade, as suas representações na dimensão macro, já a micro
história, na sua investigação busca a partir de fragmentos do cotidiano
comunitário ou de um indivíduo, identificar macro-fenômenos sociais:
‘Quando abordamos a História Regional,
enfatizamos a necessidade de pesquisarmos espaços e contextos que ficam
esquecidos, sendo valorizados somente aspectos históricos nacionais ou temas já
consagrados. [...] só se entende, então, metodologicamente falando, como parte
de um sistema de relações que ela [região] integra. Deve, portanto, ser
definida por referência ao sistema que fornece seu princípio de identidade.
Assim, pode-se falar tanto de uma região no sistema internacional ou dentro de
uma das unidades de um sistema político federativo. Pode-se falar igualmente de
uma região cujas fronteiras não coincidem com as fronteiras políticas
juridicamente definidas’. [BARROS, 2004, p. 152]
A proposição de Barros de abordar a região,
mas relacionar politicamente com as fronteiras e até mesmo com a construção de
identidades, contribui com nossa análise, na medida em que, os patrimônios
culturais imateriais representam a cultura regional, bem como contribuem na
concepção de identidades regionais.
Logo, ao longo da pesquisa lançamos nossos
olhares para a multiplicidade de ações dos grupos culturais na manutenção dos
ecomuseus e suas implicações na prática educativa histórica.
Referências
Dra. Jaqueline Aparecida Martins Zarbato é
professora de história na UFMS, e coordenadora do grupo de estudos de ensino,
mulheres e patrimônio [GEMUP]
Discente Nelson Barros da Silva Junior é
voluntario pelo projeto de Iniciação Científica [PIVIC] no âmbito de Educação
Patrimonial, Memória, Identidade Regional e História Ambiental.
ABREU, Regina; CHAGAS, Mário de Souza;
SANTOS, Myriam Sepúlveda. Museus, colecções e património: narrativas
polifónicas. Rio de Janeiro: Garamond Universitária, 2007. [Museu, memória e
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BARROS, José D’ Assunção. O campo da
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São Paulo: Martins Fontes, 2004.
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Novas Perspectivas. São Paulo,UNESP, 1992.
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Leopoldo: Oikos, p. 203-221, 2013.
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Paris: ICOM, 2004.
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considerações iniciais sobre os resultados do projeto “O que fazem as escolas
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http://portal.unesco.org/la/conventions_by_country.asp?language=E&typeconv=1&contr=pt.
Acessoem 06jun. 2010
excelente abordagem! minha dúvida é: quais métodos práticos poderiam ser utilizados para despertar o interesse do aluno de ensino básico antes e durante a visitação no ecomuseu?
ResponderExcluirthaylla giovana pereira da silva
Obrigado pela leitura.
ResponderExcluirA utilização do ecomuseu como espaço para o ensino de história e educação ambiental tem ganhado força nos últimos anos. Nós podemos planejar um roteiro, composto por duas etapas. A primeira etapa poderá realizada na escola, com objetivo de contextualizar e apresentar a importância de nos atentar as questões ambientais. A segunda etapa poderá ser realizada no ecomuseu, com objetivo de apresentar a importância daquele espaço para natureza e a comunidade ao seu entorno
atentarmos* desculpa pelo erro.
ExcluirObrigado pela leitura.
ResponderExcluirA utilização do ecomuseu como espaço para o ensino de história e educação ambiental tem ganhado força nos últimos anos. Nós podemos planejar um roteiro, composto por duas etapas. A primeira etapa poderá realizada na escola, com objetivo de contextualizar e apresentar a importância de nos atentarmos as questões ambientais. A segunda etapa poderá ser realizada no ecomuseu, com objetivo de apresentar a importância daquele espaço para natureza e a comunidade ao seu entorno
Nelson Barros da Silva Junior