Gessica de Brito Bueno e Christian Fausto Moraes dos Santos


UM CORPO AGENTE MALIGNO EM ERÁRIO MINERAL DE LUÍS GOMES FERREIRA: CONCEPÇÕES MÉDICAS ACERCA DA MENSTRUAÇÃO FEMININA NO SÉCULO XVIII



Desde a Antiguidade até o século XVIII a menstruação foi considerada um excremento impuro se enquadrando na Teoria Humoral Hipocrático-Galênica. A medicina, por meio de seu conhecimento teórico, empírico, intervenções terapêuticas  e semiologia médica, assumiu o domínio sobre os corpos, especificamente o corpo feminino, dado que esse corpo, em meandros do setecentos, ainda era considerado pelo cânone médico como “débil, frágil, de natureza imbecil e enfermiça” (DEL PRIORE, 1993, p. 151). No manual de medicina Erário Mineral (1735) de Luís Gomes Ferreira é possível analisar em seus relatos a interpretação que o cirurgião-barbeiro concebe à menstruação, um fluído venenoso que causa danos terríveis, uma vez que, pautava-se em teses e superstições acerca do útero, estigmatizando e qualificando a mulher segundo sua constituição biológica.

A complexa construção de uma medicina brasileira no século XVIII: o sangue catamenial e sua relação com a Teoria Humoral
A lógica que enquadra a menstruação na Teoria Humoral Hipocrática-Galênica pode ser investigada na fonte documental Erário Mineral quando se percebe o complexo e conflituoso processo de construção da medicina desde a Antiguidade até, em especial, no século XVIII.

Ao se considerar que o período setecentista foi, particularmente, ambientado por diversas “ciências”, permeado por diferentes discussões acerca da vida e da saúde, onde tanto líderes religiosos, doutores, quanto a população buscavam depositar sua crença em teorias que pudessem reger suas vidas, é possível aferir sobre o quanto o conceito de medicina naquele contexto poderia ser diverso (COELHO, 2002, p. 168). Ao assinalar tal configuração, retomar períodos anteriores darão margem para apontar alguns cenários que contribuíram para que a medicina interpretasse a menstruação como um líquido mortífero.

Desde o contexto medievo havia uma confusão no propósito de acolhimento nos chamados “edifícios para abrigar”, decorrendo de uma ausência de distinção entre o que seria um hospital, uma albergueria ou um manicômio (LABARGE, 1996). Assim, eram “simultaneamente uma e outra coisa” (SÁ, 1996, p. 88). A reputada medicina da antiguidade anunciou em seu tempo o autor da Teoria dos Humores, um médico grego chamado Hipócrates, onde seus princípios terapêuticos seriam apropriados pelo médico grego Galeno e, posteriormente, pelo médico polímata Avicena, no período medievo. Ulteriormente no século XVIII, essa terapêutica seria o cerne para o estudo e tratamento de doenças (COELHO,2002, p. 156).

Na Idade média a construção do saber no campo da medicina envolvia, para além disso, uma mistura de saberes que abarcavam outras esferas, como a prática astrológica, não sendo integralmente proibida, mas somente quando utilizada pelos matemáticos do oriente. Essas práticas tinham o mesmo peso de legitimidade que os Tratados médicos produzidos pelos letrados do período. Ademais, no século XVIII, a presença de manuais de medicina instrucionais seria constante no interior da malha social e psicológica na colônia mineira (ABREU, 2011, p. 14), servindo-se de consulta tanto pelos médicos quanto pelo público leigo, sendo manuseado com a finalidade de instrução da vida, sobretudo da saúde.

Almanaques chamados Lunários Perpétuos exerciam um papel salutar na condução da vida dos indivíduos na colônia mineira no setecentos, seus diagnósticos eram como uma sentença quase definitiva, quem os elaborou seguia fenômenos da própria natureza, ensinando sobre ciência, remédios, cura de doenças e sobre a menstruação das mulheres (FIGUEIRÊDO, 2014, p. 26). Havia também o uso recorrente de manuais de exorcismo, sob os domínios da religião, onde o ato de exorcizar buscava curar as pessoas de uma moléstia de feitiçaria (ibidem, 2011).

Na América portuguesa, a terapêutica africana contribuiu para resolver problemas médicos no século XVIII com seus produtos da África Centro-Ocidental, um aspecto significativo para a formulação da farmacopeia europeia (FAGUNDES, 2017). Os conhecimentos advindos dos ameríndios também podem ser encontrados nessa composição farmacêutica, pois, embora submetidos aos tratamentos galênicos praticados pelos jesuítas, estavam apoiados na flora brasileira para a cura de doenças endêmicas e saúde em geral (DEL PRIORE, 2004).

A medicina portuguesa oficial, dita erudita, que tentava interpretar os domínios do corpo, estava, pois, se afastando de compreender seu funcionamento interno. Em sua totalidade anatômica, negava práticas de cura ilegais, embora as incorporando, e pautava-se em seu diagnóstico de doenças prioritariamente no esvaziamento do excesso e acúmulo de humor que a pessoa apresentava quando estava enferma, pois a Teoria Humoral se baseava em equilibrar perturbações internas chamadas de humores, sendo eles quatro, o sangue, a fleuma, a bile amarela e a bile negra (COELHO, 2002).

Segundo Porter e Vigarello (2008, p. 443) “Não é aberrante fazer do “estado” dos fluídos, indícios do “estado” do corpo”. Ou seja, a comparação da menstruação como excremento ou fluído venenoso, dado o mistério no interior dos corpos, levando em consideração que o diagnóstico pela observação inspecionava mais os líquidos do que os sólidos, levava a menstruação regular das mulheres a serem interpretadas como resultado de um desequilíbrio interno constante. A menstruação seria encarada como um excesso e desequilíbrio humoral constante, produzido pelo aparelho reprodutor feminino, uma doença exclusiva da mulher.

O corpo feminino como “Receptáculo Maligno” no discurso médico, moral e religioso no setecentos
O corpo sempre esteve sob o domínio do discurso médico e, prioritariamente, do religioso, sendo este referência inalterável para os religiosos, relembrando-o como sacrifício pela redenção da humanidade (GÉLIS, 2008, p. 19). Mas, existe uma outra imagem do corpo que deve ser evidenciada, o corpo humano, cujo pecado o persegue desde seu nascimento. Nisto, para que ninguém se desviasse dos caminhos morais, a igreja estabeleceu diversas medidas coercitivas para o controle do corpo, e quem mais se maleficiou com esses regulamentos foram as mulheres.

O aparelho reprodutor feminino foi empregado pela igreja para controlá-las, sob o aspecto do casamento e da maternidade, pois, assim, poderia ditar seus passos (SILVA, 2019, p. 149), de modo que a investigação de seu útero estava vinculada permanentemente sobre sua natureza maternal, cujo destino estava reservado à todas. A menstruação seria designada como um sangue limpo se constituísse a vida, caso contrário assumiria como secreção suja, não servindo para nada, a não ser como causadora de moléstias (LEAL, 1995, p. 27). A medicina atribuiu à menstruação um fenômeno similar a uma doença, causada pelo desequilíbrio dos humores.
Esse corpo feminino, frágil e imperfeito, estando aberto e propício a diversas influências do mau que há no meio externo, invisíveis aos olhos, torna-se um objeto que incorpora mais facilmente a corrupção dos humores (BARREIROS, 2014, p. 46).

Doenças físicas
A mulher seria controlada e dominada pelo útero e seus instintos mais perversos, uma vez que, as teorias engendradas no furor uterino, juntamente com a proliferação de imagens sobre sua natureza perversa, já estavam possuindo comprovação científica. Ademais, seus desejos e prazeres sexuais seriam foco de atenção nos tratados médicos. O útero como protagonista da infâmia das desreguladas, as direcionariam no caminho da ninfomania, aparentemente, ocorrendo com menor frequência que a histeria, mas acompanhada dela como um de seus sintomas (Ibidem, 2004).

A concepção de que o corpo feminino é um agente maligno, embora coibido de dar à luz a uma vida, segundo o cirurgião Luís Gomes Ferreira (2002) está no fato de que sua estrutura física e, mais precisamente, seu organismo produzem um líquido nocivo, no qual as mulheres o utilizam para enfeitiçar os homens, dando-lhes de beber ou por simples contato, por objetivo conquistá-lo. No entanto, acaba por deixá-los “tontos, loucos, furiosos e os mata, porque é tal o veneno e maldade do dito sangue que, até nas coisas insensíveis, faz tais estragos e efeitos tão lamentáveis”(ibidem, 2002, p. 423), levando a acreditar que a mulher não teria boas intenções e índole virtuosa justamente por propiciar, por intermédio de seu corpo, um sangue tão danoso, no qual é letal à sua própria saúde física e mental quanto a do homem, que por engano viesse a cometer tal erro.

Quando ocorriam mortes em que um homem falecia e não se encontrava a causa, muitas opiniões, seja médica ou de cunho popular, reforçavam a presença de feitiços feitos por mulheres que se utilizavam de seu sangue menstrual. Logo, as opiniões populares do período estavam banhadas de superstições que, à época, tinham caráter de factualidade. Assim como, a mesma noção iria permear sobre o imaginário médico do setecentos.

Ilustração do anatomista Johann Remmelin, 1619, Universidade de Lowa.


Fonte: https://publicdomainreview.org/collection/remmelin-s-anatomical-flap-book-1667

Doenças mentais
A revolução burguesa do século XVIII apregoaria a igualdade, mas que jamais se concretizaria. No entanto, alicercearia uma nova ordem social, dentro de um ideário onde passaria a controlar o cotidiano dos indivíduos, seus gestos e pensamentos. A sociedade burguesa irá se munir de instrumentos de coerção, aliada ao fenômeno da medicalização na medicina, transferirá seu pensamento “preventivo” sobre o que poderia vir a ser ou contrair, em relação aos corpos, para o imaginário social, que incorporará um senso de higienização e moral, cerceando, quiçá eliminando, a partir de então, toda a autonomia da mulher (VIGARELLO, 2008).

Foi, pois, uma cultura masculina que procurou construir uma leitura do comportamento da mulher, seja interpretando-a no que diz respeito ao seu corpo e seu psicológico, seja concebendo modelos morais de conduta, as medidas coercitivas sobre seu corpo as levariam a se enquadrar numa condição de espécie fraca  e de mente desequilibrada, de modo que a sociedade alimentaria uma hostilidade em relação a tudo o que a mulher e seu corpo estivesse envolvido. O sangue menstrual, por sua vez, foi relacionado a uma gama de estigmas, o corpo da mulher passou a ser encarado como “um animal voraz e feroz” (ibidem, 2019, p. 149) e devido a esse corpo, ao mesmo tempo frágil e inquieto, seria mais propenso a desenvolver transtornos mentais (ibidem, 2004, p. 333).

O comportamento das mulheres quando não lhe vinham a conjunção era, muitas vezes, associado à histeria, uma vez que o sangue menstrual acaba por assumir o protagonismo sobre diversas moléstias, o fluído poderia causar doenças tanto nela quanto em quem entrasse em contato com seu excremento venenoso. Elucida-se uma leitura religiosa, em que a medicina se ampara, ao visualizar seu corpo como um veículo que incorpora o mau, senão, é o próprio mau, e é a intermediária da histeria (BOLLAS, 2000).“A noção de repulsa, de perigo e de evitação” em relação ao sangue menstrual ou a mulher nesse estado está ligado a crença de que esse fluído catamenial é “simbolicamente potente, poderoso, forte, fértil”, temendo os homens de se tornarem impotentes e loucos (LEAL, 1995, p. 26).

Se o prelúdio é o útero, logo a mulher teria mais propensão a contrair diversas doenças, principalmente transtornos mentais, mas o fato é que muitas das vezes seu corpo, sua sexualidade é colocada em pauta para identificar patologias, uma vez que já eram consideradas, por natureza, inclinadas a desenvolver perturbações mentais pelo indecifrável funcionamento do seu organismo, como também pelos seus atos libidinosos, e esses, quando se desconfiava que havia, eram reprimidos e qualquer que fosse seus desejos e ânsias. E em meio a esse ambiente, o procedimento padrão para identificação da histeria, tal como a ninfomania, seria perceber se uma pessoa, prioritariamente mulher, estava demonstrando inquietação com o corpo, fazendo uso racional do sexo e demonstrando ter orgasmos com muita frequência (Ibidem, 2004).

O aspecto significativo é que a transgressão pela sexualidade estaria atrelada a essas curiosidades por parte da mulher, ela, por sua vez, seria fortemente reprimida por sua intromissão naquilo que já estava sendo teorizado pelos médicos sobre seu corpo, medidas essas coercitivas que segundo Matthews-Grieco (2008) alienariam  mentes, tanto de mulheres como de homens, onde Sigmund Freud diria mais tarde que “o prazer sexual seria incompatível com a sociedade civilizada” (Ibidem, 2008, p. 219), ou pelo menos, forçosamente civilizada.

Conclusão
O aparelho genital da mulher, tinha, então, forte domínio sobre o estado mental das mulheres, seu corpo é um teatro de expressões e manifestações, numa linguagem onde poderia denunciar as suas fragilidades. As mulheres teriam de enfrentar dúvidas sobre seu próprio corpo e, infelizmente, admitir que era uma doente, diante de uma sociedade que a forçaria a se sujeitar.

O cirurgião Gomes Ferreira, em seus tratados, tratou de inúmeras doenças venéreas, e nessas ocasiões sublinhava a necessidade dos homens se afastarem das “mulheres depravadas”, visto que as associavam a todo tipo de mau e bruxaria, ora, o português afirma que o sangue menstrual das mulheres seria capaz de inúmeras vezes arruinar o membro masculino, no que culminaria no homem uma profunda loucura e falta de juízo (DIAS, 2002, p. 88). Um sangue que parecia possuir uma condição de alteridade, alojando-se no corpo da mulher, fazendo-a sucumbir a diversas ações malignas (Ibidem, 1995, p. 22).

É considerável descortinar o véu que escondia o medo coletivo quando o assunto era a histeria e a loucura, e, mais precisamente, tudo que envolvia a mulher e seu corpo, os autores dos discursos médicos acerca do aparelho reprodutor feminino e, mais precisamente, da menstruação, eram homens, e essa categoria tinha medo do que não conhecia (BARREIROS, 2014). Justificamos a pesquisa aqui apresentada, sob a necessidade de esquadrinhar como se deu este importante processo em que enquadra a menstruação a algo relacionado ao mau, de natureza venenosa, e como o fenômeno da menstruação foi sendo concebido pelo imaginário coletivo e pela ciência médica no século XVIII.

Referências
Gessica de Brito Bueno é graduada em Artes Visuais e graduanda do curso de História na Universidade Estadual de Maringá, bolsista PIC.

ABREU, Jean Luiz Neves Abreu. Nos domínios do corpo: o saber médico luso-brasileiro no século XVIII. Rio de Janeiro: Editora FIORUZ, 2011.
BARREIROS. Bruno Paulo Fernandes. Concepções do Corpo no Portugal do Século XVIII: Sensibilidade, Higiene e Saúde Pública. 2014. Disponível em: https://run.unl.pt/bitstream/10362/14924/1/Barreiros_2014.pdf.
BOLLAS, Christopher. Hysteria. Tradução de Monica seincman. –São Paulo: Escuta, 2000.
COELHO, Ronaldo Simões. O Erário Mineral divertido e curioso: a arte de curar. In: FURTADO, Júnia Ferreira (org.). Erário Mineral de Luís Gomes Ferreira. Belo Horizonte; Rio de Janeiro: Fundação João Pinheiro, Centro de Estudos Históricos e Culturais; Oswaldo Cruz, 2002.
DEL PRIORE, Mary. Ao sul do corpo: condições femininas, maternidades e mentalidades no Brasil colônia. Brasília, Rio de Janeiro: EdUnB, José Olímpio, 1993..
DEL PRIORE, Mary. História das mulheres no Brasil. (Org) Carla Bassanesi. 7. ed. –São Paulo: Contexto, 2004.
DIAS, Maria Odila Leite da Silva. Sertões do Rio das Velhas e das Gerais: vida social numa frente de povoamento -1710-1733. In: FURTADO, Júnia Ferreira (org.). Erário Mineral de Luís Gomes Ferreira. Belo Horizonte; Rio de Janeiro: Fundação João Pinheiro, Centro de Estudos Históricos e Culturais; Oswaldo Cruz, 2002.

FAGUNDES, Fernanda Ribeiro Rocha. As práticas de cura africana, que viajaram nas redes de informações do império ultramarino português: final do século XVIII e início do XIX. 2017. Disponível em:
https://www.academia.edu/34902862/AS_PR%C3%81TICAS_DE_CURA_AFRICANAS_QUE_VIAJARAM_NAS_REDES_DE_INFORMA%C3%87%C3%95ES_DO_IMP%C3%89RIO_ULTRAMARINO_PORTUGU%C3%8AS_Final_do_s%C3%A9culo_XVIII_e_in%C3%ADcio_do_XIX
FERREIRA, Luís Gomes Ferreira. Tratado I: da cura das pontadas pleuríticas e suas observações. In: FURTADO, Júnia Ferreira (org.). Erário Mineral de Luís Gomes Ferreira. Belo Horizonte; Rio de Janeiro: Fundação João Pinheiro, Centro de Estudos Históricos e Culturais; Oswaldo Cruz, 2002.
FIGUEIRÊDO, F. F. As fortunas eruditas e populares do Lunário Perpétuo. Imburana – revista do Núcleo Câmara Cascudo de Estudos Norte-Rio-Grandenses/UFRN.    n. 9, jan./jun. 2014.
GÉLIS, Jacques. O corpo, a igreja e o sagrado. In: CORBIN, Alain, COURTINE, Jean-Jacques, VIGARELLO, Georges. "História do corpo." Rio de Janeiro: Vozes 2. 2008.
LABARGE, Margaret Wade. La mujer en la Edad Media. Madri: NEREA, 1996.
LEAL, Ondina Fachel. Sangue, fertilidade e práticas contraceptivas. In: Corpo e significado: ensaios de antropologia social. Editora da Universidade- UFRS. 1995.
MATTHEUS-GRIECOO, Sara F. Corpo e sexualidade na Europa do Antigo Regime. In: CORBIN, Alain. COURTINE, Jean-Jacques. VIGARELLO, Georges. História do Corpo: Da Renascença às Luzes – Vol I. Petrópolis: Editora Vozes, 2008.
PORTER, Roy, VIGARELLO, Georges. Corpo, saúde e doenças: In: CORBIN, Alain, COURTINE, Jean-Jacques, VIGARELLO, Georges. "História do corpo." Rio de Janeiro: Vozes 2. 2008.
SÁ, Isabel dos Guimarães. Os Hospitais portugueses entre a assistência medieval e a intensificação dos cuidados médicos no período moderno. In Congresso Comemorativo do V centenário da Fundação do Hospital Real do Espírito Santo de Évora. Évora: Hospital do Espírito Santo, 1996. ISBN 972-97028-0-2. p. 87-103. Disponível em:
https://repositorium.sdum.uminho.pt/bitstream/1822/4313/1/hospitais.pdf.
SILVA. Luisa Stella de oliveira coutinho. O saber médico e o corpo das mulheres no Brasil colonial: a tradição médica da metrópole na Capitania da Paraíba. 2019. Disponível em:
https://journals.iai.spkberlin.de/index.php/iberoamericana/article/view/2453> Acesso em 17 mar. 2020.
VIGARELLO, Georges. História do Corpo: Da Renascença às Luzes – Vol I. Petrópolis: Editora Vozes, 2008

18 comentários:

  1. Ótima pesquisa! Ao lermos sobre a trajetoria dos estudos sobre o corpo feminino percebemos que ainda existem certos tabus que o permeiam, principalmente a respeito da menstruação. Me surgiu uma dúvida, a partir de qual momento esse paradigma da lugar a outras pesquisas que desmitificam esse entendimento sobre o corpo feminino?

    Angeliane Arceni Chefer

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    1. Olá Angeliane!
      Muito grata!
      Esse paradigma acerca da menstruação e sua relação com a Teoria Humoral vai começar a ser contestado quando alguns anatomistas, médicos e cirurgiões começam a incorporar fundamentos do racionalismo, bem como, indo em defesa do experimentalismo, o que irá ocorrer por volta do século XIX, muito embora no final do século XVIII e início do XIX as descobertas por meio das dissecações anatômicas iriam ser usadas pra justificar a submissão das mulheres face aos homens. É a partir dos estudos anatômicos e fisiológicos que se depreendeu que a menstruação é um fenômeno biológico feminino. Contudo, muitas culturas ainda tratam o tema como um tabu, delegando o sangue menstrual a algo ruim ou um castigo.
      Espero ter respondido sua questão.

      Atenciosamente
      Gessica de Brito Bueno

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  2. Como foi colocado no inicio do texto, Luís Gomes Ferreira, na obra Erário Mineral (1735), associa a menstruação como algo maleficente. No entanto, como as próprias mulheres encaravam a menstruação nesse período?

    Gustavo Manchini Cardozo

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    1. Olá Gustavo!

      Nos relatos circunstanciados na fonte documental Erário Mineral é possível perceber que as mulheres do século XVIII também acreditavam que seu sangue menstrual era maléfico, pois, o conhecimento sobre seus corpos estava sendo produzido por homens, cientistas e doutores, que afirmavam ser o sangue menstrual um fluído venenoso, elas acreditavam ter um corpo de natureza enfermiça, em constante desequilíbrio, físico e psicológico.

      Espero ter respondido sua questão.

      Atenciosamente
      Gessica de Brito Bueno

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  3. Partindo da ideia que a Igreja e os médicos pensavam que a menstruação poderia causar mal ao corpo feminino e masculino, havia alguma lei que proibia a prática sexual durante esse período? Era considerado pecado?

    João Primon

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    1. Olá João!
      Boa pergunta! Em Minas Gerais, no século XVIII, as opiniões médicas a respeito da menstruação eram de caráter preventivo, até atemorizante, pois ter relações sexuais com uma mulher em período menstrual é correr o risco de perder a sanidade, bem como se tornariam impotentes, sendo o ato considerado pecado. Logo, havia uma repulsa e evitação em relação ao sangue catamenial, medos alimentados pelas instituições religiosas. As representações acerca do sangue maléfico eram fortes o suficiente para amedrontar o imaginário, muito embora há diversos relatos em que homens e mulheres tiveram relações sob essas circunstâncias. Não havia uma lei que os impedisse, mas quando algum homem, por coincidência, adoecesse logo após uma relação e contato com o sangue, responsabilizavam as mulheres pela moléstia.

      Espero ter respondido sua questão.

      Atenciosamente
      Gessica de Brito Bueno

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  4. Levando em consideração de que a menstruação considerada um fluido venenoso, existem relatos da época de como as mulheres reagiam e encaravam a primeira menstruação? e relatos de mulheres que paravam de menstruar (menopausa)? Como que as mulheres se resguardavam no período menstrual?

    Carolina Freitas

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    1. Boa noite Carolina!

      No século XVIII a igreja volta sua preocupação para a mulher onde evidencia sua contribuição positiva por meio de seu papel como mãe, esposa e a administradora do lar. Logo, as meninas brancas, atenção, após sua primeira menstruação, voltava sua identidade para o interior do núcleo doméstico. Considerando que estamos tratando de um contexto onde havia escravidão no Brasil, e a pesquisa é muito mais voltada sobre as mulheres negras, a situação das negras seria diferente e mais dolorosa. Em muitos relatos, o cirurgião-barbeiro Luís Gomes Ferreira escreve que ajudou negras que estavam doentes, pois seu sangue não havia descido. Num contexto em que elas deveriam trabalhar para seus senhores, seja em boticas, na casa grande ou vendendo alimentos, elas eram obrigadas a esconderem seu ciclo, sobretudo, nem eram consideradas como seres humanos, e sim um objeto de satisfação sexual, bem como, instrumento de trabalho. Enquanto as brancas se resguardavam em suas casas, as negras continuariam realizando seus trabalhos, sob abusos e torturas.
      Espero ter respondido a sua questão.

      Atenciosamente
      Gessica de Brito Bueno

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  5. Olá,
    Gostaria de saber as possíveis maneiras que essa temática poderia ser abordada em sala de aula?

    Daiane da Silva Vicente

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    1. Boa noite Daiane!

      Primeiramente é preciso desmistificar os tabus existentes em torno deste tema, levando textos e ilustrações, estimulando a participação dos alunos para responderem o que acham sobre o assunto. Ao tratar do tema, utilizar embasamentos científicos, tanto para o fundamental quanto para o médio, numa linguagem acessível para que possam compreender e questionar superstições acerca da menstruação.
      Espero ter respondido sua questão

      Atenciosamente
      Gessica de Brito Bueno

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  6. A partir da leitura da pesquisa, fica evidente o papel hegemônico das instituições religiosas e patriarcais, dentro do embasamento teórico científico do passado. Mesmo quando são assuntos que remetem a questões pertinentes, primeiramente, ao universo da mulher, que acabava não tendo parte optativa dentro da elaboração de argumentos construtivos, o que por consequência, acabou fomentando tantos tabus a respeito do funcionamento do corpo feminino.
    Considerando o desenvolvimento da medicina atual, como poderíamos pontuar um fator determinante dentro dessa ascensão? O que culminou na mudança dos paradigmas das pesquisas com ramificações biológicas, ora lideradas exclusivamente por agentes masculinos?

    Vitor F Assis

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    1. Olá Vitor!

      Um fator determinante dentro dessa ascensão? Os homens, por muito tempo, lideraram as produções científicas, filosóficas, literárias acerca da vida e do corpo. Certamente, as teorias religiosas incentivaram esse tipo de atitude, o patriarcado é produto de um sentimento de superioridade, tanto em relação as mulheres quanto em relação a natureza. As mudanças de paradigmas no campo da ciência e estudos anatômicos ocorreram paulatinamente, pois seria necessário superar a resistência ao experimentalismo, de cunho teórico e mecânico, que compreenderia o funcionamento do corpo feminino.
      Espero ter respondido sua questão

      Atenciosamente
      Gessica de Brito Bueno

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  7. Você acha que essa construção sobre o corpo feminino e seus fluídos no século XVIII ainda permeia a visão sobre a mulher no século XXI? De que maneira?

    Daiane Momo Daneluz

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    1. Boa noite Daiane!

      O Brasil do século XXI ainda carrega muitos de seus tabus do século XVIII, por exemplo, relações sexuais em período menstrual? Ocorrem, mas não é algo se se comente com naturalidade em um ciclo de pessoas desconhecidas. Assim como, as mulheres continuam a sentir certo constrangimento quando o assunto surge ou quando por acidente alguém descobre que está menstruando. Foram tantos anos de representações maléficas acerca do sangue menstrual, que ainda hoje elas ainda permeiam.
      Espero ter respondido sua questão

      Atenciosamente
      Gessica de Brito Bueno

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  8. Primeiramente, quero dar os parabéns pelo excelente trabalho, que se faz muito importante para entendermos como o presente assunto era tratado no período analisado. Segue a pergunta: Em Erário Mineral, de Luís Gomes Ferreira, as mulheres citadas na narrativa eram somente brancas ou as mulheres negras também apareciam? E qual a importância desse elemento ficar claro durante a narrativa?

    Bruno Novello

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    1. Olá Bruno!
      Muito grata!!
      Na fonte documental Erário Mineral a maioria das mulheres que são citadas na obra são negras escravas, pois trata-se, ainda, do período da escravidão, há alguns relatos sobre mulheres brancas, porém, nos tratados do volume II, bem como, no volume I, as receitas e procedimentos médicos para fazer vir a conjunção eram voltadas, praticamente, para as negras, que, como se percebeu, tinham uma grande importância de cunho econômico no período. É importante evidenciar esse aspecto principalmente porque trata-se, ainda que não tenha sido intencional escrever a obra sobre elas, da história de mulheres negras que foram negligenciadas tanto no período quanto nos livros de histórias que temos acesso hoje, é por isso que a pesquisa se volta, para além da menstruação, para a mulher negra do século XVIII.
      Espero ter respondido sua questão

      Atenciosamente
      Gessica de Brito Bueno

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